Segundo à Medicina Chinesa, “A saúde resulta da harmonia entre as funções fisiológicas, e entre o organismo e a natureza”. Mas, quando defendem que “a falta de harmonia interna provoca bloqueio da energia vital do corpo, conhecida como qi, que flui ao longo de 12 meridianos primários e de 8 secundários”. Feito este preâmbulo, vou resumir uma revisão sobre o papel da acupuntura no tratamento das dores lombares, publicada no The New England Journal of Medicine, a revista de maior circulação entre os médicos. Aos seguidores das assim chamadas práticas alternativas e aos que se atêm ao empiricismo da ciência ocidental, deixo claro que não acrescentarei ao texto pensamentos de minha autoria.
Em algum momento da vida, três em cada quatro pessoas apresentarão crises de dor na coluna lombar. Os sintomas costumam regredir em até 6 semanas, mas podem recidivar. Em 7% dos casos o quadro se torna crônico.
Embora hérnias de disco, fraturas, alterações anatômicas, infecções ou câncer possam provocar esse tipo de dor, em 85% das vezes a causa é inespecífica, complexa e multifatorial. Os mecanismos envolvem a própria anatomia da coluna lombar, alterações no sistema nervoso central e fatores psicológicos e comportamentais.
As tentativas para caracterizar os efeitos da acupuntura de acordo com os princípios da medicina ocidental têm fracassado por três razões: 1) a maioria dos estudos foi conduzida em animais; 2) como a acupuntura estimula diversas terminações nervosas, fica difícil analisar as respostas; 3) a experiência da acupuntura é dominada por um contexto psicológico e social cheio de crenças e expectativas que interferem com os resultados.
Apesar dessas limitações, foram descritos fenômenos fisiológicos claramente associados a ela: 1) anestesiar os locais em que as agulhas serão introduzidas bloqueia o efeito analgésico, sugerindo que a atividade depende da inervação, 2) durante a aplicação das agulhas, há liberação de opióides em várias áreas do cérebro; 3) as picadas provocam estímulos mecânicos no tecido conjuntivo, liberam mediadores envolvidos no mecanismo da dor e aumentam o fluxo sanguíneo local.
Diversos estudos clínicos avaliaram sua eficácia no tratamento da dor lombar.
Uma análise de diversas casuísticas (metanálise) envolvendo 6359 pacientes mostrou que a acupuntura realizada segundo a técnica tradicional não mostrou resposta melhor do que a “falsa” acupuntura, procedimento executado com dispositivos que dão a sensação de que as agulhas estão sendo introduzidas sem que realmente o sejam, ou efetuado por meio da introdução bem superficial em pontos aleatórios, distantes dos meridianos recomendados.
Apesar de tudo, tanto a “verdadeira” quanto a “falsa” melhoraram os resultados do tratamento convencional com anti-inflamatórios e fisioterapia.
Um estudo alemão dividiu ao acaso 1.162 pacientes em 3 grupos: tratamento com anti-inflamatórios e fisioterapia, acupuntura “verdadeira” ou acupuntura “falsa”. Depois de 6 meses, os índices de resposta da acupuntura verdadeira foram iguais aos da “falsa”, porém superiores aos do tratamento convencional.
Outro estudo realizado na Alemanha sorteou 3.093 pacientes para receber o tratamento convencional com ou sem acupuntura “verdadeira”. O alívio das dores avaliado 3 meses mais tarde foi significativamente superior no grupo com acupuntura.
Os autores da revisão concluem que embora a acupuntura “verdadeira” não tenha demonstrado superioridade em relação à “falsa”, parece razoável associá-la aos anti-inflamatórios e aos exercícios, numa abordagem multidisciplinar.
Advertem, no entanto, que os pacientes com mais de 50 anos, os portadores de déficits neurológicos, câncer, deformidades na coluna ou que apresentem febre, perda de peso ou queda do estado geral devem ser avaliados clinicamente para afastar a possibilidade de doenças graves.
Com o aumento do número de profissionais na área da saúde, tomo a liberdade de acrescentar, a acupuntura deve ser realizada por profissionais treinados. Não basta ser chinês.
Nenhum comentário:
Postar um comentário